terça-feira, 18 de agosto de 2009

Cigano e Distância






CIGANO

       Rosemary Amabile















 Olhar teus negros, lindos olhos, 

 penetrar no desvão do tempo...
 Deixar um longínquo chamado, 
 tanto tempo ausente,
 transportar-me a um amor antigo.

 Por que os amores se desfazem?
 Por que a vida ou a morte nos separam?
 Por que a benção do Eterno 
 não permite ao amor continuar?

 Que fala é essa? Vibra em meus ouvidos.
 A voz eu ouço, mas essas palavras 
 são sons  sem entendimento.
 A mesma voz, tão agradável 
 o som dessa voz!
 Vibra no meu ventre essa voz!

 Os olhos não,
 os olhos riem para mim, riem de mim,
 me acarinham e me ferem.
 Me transtornam, me seduzem.

 Alucinada sinto em mim risos 
 e prantos antigos
 a transpassar-me ainda.
 Graça e desgraça em meu peito
 Não passaram... não se foram.
 Clamam desejo e medo 
 em dores de parto.
 Nasce ou renasce esse amor
 No teu olhar cigano.






DISTÂNCIA 


 Rosemary Amabile














 Idólatra eu escavando tórridas areias
 buscando tua serpentina imagem
 em perdido pretérito 
 soterrado no sem-tempo.
 Arqueólogo obcecado por único tesouro

 Não que aguerrido eu não fosse,
 cobrindo geografias 
 com meus pés e fôlego,
 para buscar onde te encontras,
 e tocar-te como quem 
 desbrava a terra em posse

 Não que destemido eu não fosse
 para singrar a nau, a oceânica separação
 entre teu respirar e o meu
 e arfar em teu corpo, 
 a resgatar-me náufrago da solidão

 Não que impávido eu não fosse
 e espaçonauta, por meus pés 
 em lumes celestes
 a desvendar a qual estrela 
 teu brilho emprestas
 Qual é esse fado que me orienta 
 em desérticas noites?

 Só te falo em letras, 
 a cada dia beijo-te em Ah!
 Deito-me com teu corpo em Oh!
 Possuo-te em Ais!
 A cada dia sou tua em letras.
 E não!
 Pois não há letra 
 que me enxugue os olhos
 Nem que os preencha com a tua visão

 E fiel a tantas exclamações
 inseguras, equilibrando-se 
 num ínfimo círculo.
 Retorço-me em arco e me transformo
 numa interrogação. Ainda insegura!


 Mas curvada em prece
 Oh Eterno! Pai me ouve?
 E entre um ponto ou outro 
 continuo em infinita espera
 No sábio, algoz e mestre, 
 tempo das reticências...




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